Por que toda terça é dia de milagre!
Nada mais justo do que numa terça-feira de inferno astral homenagear a santíssima Dona Cleusa - sobretudo porque hoje ela deve ter saído lá de casa direto prá seção de fisioterapia depois de TANTA roupa prá passar.
Enfim. Vou falar sobre como Dona Cleusa apareceu em nossa vida e tornou-se santa.
Logo nos primeiros meses de juntados optamos por otimizar alguns custos e contratar a mesma faxineira que fazia a limpeza na casa do meu pai. A cidadã, chamada Pafúncia*, era uma faxineira como quase todas. Sem grandes ímpetos de proatividade e com a capacidade ímpar de usar Veja como ingrediente de coquetéis saborosíssimos. Imaginem o quanto eu gastava de Veja. Veja prá limpar a casa toda + Veja prá Pafúncia beber. Sim, porque ela bebia. Só podia ser.
Mas então. O tempo passava, Pafúncia fazia o serviço dela, de vez em quando eu precisava dar uns "presta atenção", mas nada que excedesse os parâmetros da normalidade e claro, da boa educação.
Eis que então me deram férias de última hora no trabalho. Três semanas I-N-T-E-I-R-I-N-H-A-S prá ficar em casa bestando e fazendo monografia. Ah que delícia, não?! Sem poder programar minhas férias a única decisão que tomei de antemão foi: toda terça vou ficar o dia todo fora de casa prá não estressar com a Pafúncia. E assim eu fiz, na primeira, segunda e na terceira semana. Com a diferença de que, é claro, dei algumas instruções mais detalhadas prá moça. Afinal de contas, se você tem alguém que limpa sua casa somente uma vez por semana é necessário certa disciplina para manter o ambiente salubre.
Enfim. Na terceira terça-feira de férias Pafúncia chegou em casa por volta das 10 horas e me pegava de saída para uma cosulta médica. Disse à ela "Pafúncia, por favor, você passa a roupa primeiro e depois faz isso e aquilo porque no fim do dia eu preciso do último isso pronto, ok?". "Ok, dona", ela respondeu.
Saí despreocupada da vida crente que quando eu chegasse em casa as coisas estariam perfeitas, nos conformes. Voltei um pouco antes do esperado prá casa e qual não foi a minha surpresa ao ver Pafúncia na sala, falando ao telefone, com o rádio, a TV, o aspirador e o ferro de passar ligados?! Prá completar o furdúncio meu pano de prato lindo de viver, presente de uma amiga especialíssima, estava sendo usado prá passar REMOVEDOR DE CERA! Prestem atenção! O pano de prato novinho e bordado estava preto, imundo, zuado porque a infeliz resolveu passar removedor de cera com ele. Aí não deu. Eu, que sou uma pessoa normal, extrapolei os limites. Surtei, mas engoli. Fingi que não vi. Fui à cozinha e entrei na área de serviço: os Vejas que eu havia comprado há 1 semana estavam todos vazios. Aí eu gritei.
"Pafúncia, vem aqui por favor!". "A dona! To aqui na sala.", "Vem aqui A-G-O-R-A". Ela veio. Com a cara mais lavada do mundo (provavelmente lavada com todos os Vejas que eu havia comprado) e disse "Ôquifoi?". "Pafúncia, veja só: eu não havia pedido prá você passar roupa e fazer isso e isso depois? Porque você está, a essa hora passando roupa?", "Ué, porque eu faço como eu quero", "Opa! Resposta errada. Na minha casa você faz as coisas como EU quero, certo?", "Se você não gosta assim... problema seu". Respira, respira, respira, respira. "Ok Pafúncia, você sabe que isso aqui é um pano de prato?", "Sei sim.", "Se você sabe que é um pano de prato porque você tá usando prá fazer limpeza?", "Porque aqui não tem o pano que eu gosto.", "Olha, Pafúncia, é o seguinte. Se aqui não tem o pano que você gosta você me avisa que eu compro, mas não usa o meu pano de prato prá isso", "O que eu gosto não se compra." -
obs. juro por Deus que ela me respondeu isso - "Pafúncia, é o seguinte você ia gostar se alguém chegasse na sua casa e usasse as suas coisas e estragasse seus panos de pratos prá fazer limpeza?", "Não, claro que não, né", "Pois bem. Eu detesto." -
até esse momento a conversa tinha um tom tenso, mas ninguém gritava. Até esse momento. - "Você tá fazendo esse escândalo porque eu usei seu pano de prato? Porque se você não gosta assim então faça você! Vai à merda!". Nossa. Aí não deu. Aí o nível baixou:
"Escuta aqui Pafúncia, a porta da rua a serventia da casa! Sai daqui agora. Pega suas coisas e não olha prá minha cara."
(Sempre sonhei em falar isso). Ela saiu, pegou o pagamento e foi. Deixou todas as coisas inacabadas. Não tinha passado a roupa e muito menos o primeiro e o segundo "isso". Nem os panos, nem os baldes, nem os eletrônicos ela desligou. Uma F.D.P..
Só que aí eu grito, mas eu faço. Fiquei com tanta raiva que fiz a faxina do século. O sofá branco reluzia. O piso, que precisa de sinteco quase cegava de tanto brilho. Horas depois, com a casa pronta e eu mais calma, resolvi ligar pro porteiro. "Seu Zé, o senhor conhece alguma faxineira de confiança? Eu mandei a Pafúncia embora e preciso de alguém que venha essa semana ainda prá passar roupa", "Olha Dona, tem a Dona Cleusa, que trabalha aqui no 7º andar há 11 anos. O marido dela já foi zelador aqui do prédio, se a senhora quiser, peço prá ela passar aí mais tarde e falar com a senhora.", "Beleza seu Zé, manda bala".
40 minutos depois...Dim Dom! (onomatopéia da campainha)
"Oi Dona Cleusa, entra, senta". Caminhando em direção ao sofá eu disse: "Sabe o que é Dona Cleusa, eu não estava gostando do serviço da Pafúncia e decidi dispensá-la. Queria saber se a senhora tem algum dia da semana livre prá trabalhar aqui em casa". Chegando na sala de estar: Dona Cleusa pára, tira os sapatos, arruma o par ao lado da poltrona. Só então pisa no tapete branco da sala. Pensei. Pronto! Contratei! É nóis! Se a mulher não pisa de sapato no tapete branco prá não sujar, deve ser a melhor Dona de casa do mundo!!!! Em seguida Dona Cleusa diz: "Olha Dona. Eu trabalho em três casas, mas tenho a terça-feira livre. Eu sei que não é um dia muito bom, mas se a senhora quiser posso vir amanhã (amanhã era quarta-feira) prá senhora não ficar na mão e aí a senhora aproveita e me explica como a senhora gosta que eu faça as coisas aqui na sua casa. Que produto eu uso, como deixo as camisas do seu marido passadas". PUTAQUELPARIU!!!!!!A MULHER É TUDOOOOOOO DE BOOOOOMMMM!!!! Pensava eu, sem dar pala que queria fazer montinho e dar um beijo na bochecha fofa dela! Aí respondi seriamente: "Claro Dona Cleusa, seria ótimo se a senhora pudesse vir amanhã, por mim está fechado. E a propósito 'Dona' está lá no céu hein?!". Ela riu fofamente, como faz até hoje. Uma risada bonitinha, querida. E desde então as terças-feiras são dias santos em casa.
Depois eu explico como veio o apelido!
Fui!
* O nome da pessoa foi trocado prá manter um mínimo de dignidade.